segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Coluna Vale a Pena

A coluna "Vale a Pena" deste domingo do jornal "Tribuna de Minas" teve como personagem um dos idealizadores do Cineclube Bordel sem ParedeS, Wesley Conrado que falou um pouco do seu amor por cinema e da motivação de se criar um cineclube, além de falar de seus gostos culturais.


O sonho do cinema

“Trabalho como cozinheiro profissional, mas a minha verdadeira paixão é o cinema”, diz Wesley Conrado, 25 anos, idealizador do CineClube, em atividade no Anfiteatro João Carriço da Funalfa. “Sempre tive vontade de começar um projeto no qual pessoas interessadas em cinema pudessem ter acesso a filmes fora do circuito comercial”, explica o paranaense que trocou Joinville por Juiz de Fora no início do ano. Atualmente, o CineClube oferece à população sessões dedicadas aos primeiros filmes realizados pelo cineasta espanhol Pedro Almodóvar.

Para Wesley, o ramo da gastronomia serve como um ganha-pão, enquanto não consegue fazer da sétima arte seu meio profissional. “Mal vejo a hora de poder viver completamente para o cinema”, diz o aspirante a roteirista. “Acho o roteiro a parte mais importante de um filme, além de ser a que mais me desperta curiosidade.” Nas horas livres, Conrado, que trabalha no restaurante Til quatro dias na semana, aproveita para conferir as sessões promocionais oferecidas pelos cinemas da cidade e se dedicar a uma outra grande paixão: a leitura.

Filme
“Rocky horror picture show”, de Jim Sharman
“É um filme totalmente contra a caretice. É tudo o que eu queria ser”

Diretor
Lars von Trier
“Os filmes dele são profundos, sempre estão ligados a filosofia, psicologia, sociologia”

Atriz
Helena Ignez e Maria Gladys
“Musas do cinema brasileiro dito marginal”

Livro
“Esculpir o tempo”, de Andrei Tarkovski
“Ele mudou a forma como eu vejo a sétima arte, ao mostrar no livro todo o conhecimento acumulado durante sua carreira como cineasta”

CD
“Our map to the Monster Olimpics”, da banda Kira Kira
“É de uma banda islandesa que conheci este ano. Eles fazem um som sensível, sutil”

Exposição
“Paris no Cinema”, em cartaz no Espaço Cultural dos Correios
“Na exposição, eles estão exibindo filmes ótimos e raros”

quinta-feira, 26 de agosto de 2010














Paixões obsessivas; transgressão; perda; morte; sobrevivência. 


Há algo mais, claro. Paixões obsessivas são vistas com uma proximidade rara, um tremendo grau de carinho e compreensão, sem dúvida até um certo fascínio. Nada mais belo para uma estória que envolver paixões arrebatadoras, claro. Mas o caso aqui não é de florear as estórias – é a própria base delas. As estórias de Almodóvar partem de paixões morbidamente enlouquecidas – sem dúvida as paixões fogosas de Antonio (às vezes chamado de Ángel) de A Lei do Desejo, do Ricky de Ata-me, do Victor de Carne Tremula e de Benigno em Fale com Ela, mas também as paixões magoadas ou perdidas da Pepa de Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos, da Leo de A Flor do Meu Segredo, da Manuela de Tudo Sobre Minha Mãe e de Lydia e Marco em Fale Com Ela.

É bom esclarecer – não há aqui desejo sem paixão. Pode haver tesão, mas não desejo. A produtora de Almodóvar se chama El Deseo (foi aberta à época de A Lei Do Desejo). Mas o assunto não é tesão – é desejo desvairado. Sexo deve funcionar para fazer o outro enlouquecer de paixão (querem ser os melhores fodedores do mundo Antonio, Ricky e Victor). Não há paixão amena, tampouco.

O tema da perda amorosa é assunto de tudo – mais do que de cinema, de vida. Personagens lidando com perdas são um caminho natural para um cinema que se pretenda ligado a sentimentos.

A transgressão não acontece por represália ou confronto – cada um é como é, é como acredita que precisa ser, apenas isso. Policiais cheiram cocaína, homens se tornam gays ou travestis, pessoas de ambos os sexos transam sem preocupação com fidelidade – e isso não acontece por uma busca da transgressão, mas apenas de se agir de maneira a ser feliz (ao cheirar carreiras de cocaína em A Lei Do Desejo, o policial comenta que não lhe seria fácil viver sem um pouquinho daquilo...). Que não se confunda aqui, então, a postura do cineasta e de seus personagens – os personagens não transgridem por política, mas porque assim se sentem felizes e ninguém tem nada com isso. Quanto aos filmes, não é por acaso que buscam observar transgressões diversas – e, na maior parte dos casos, compreender. O desejo assassino é observado com fascínio (em Matador ou Kika), assim como a perseguição por amor, que se revela doentia em A Lei do Desejo e Ata-me, encontra versões mais carinhosas em Carne Trêmula e até Fale Com Ela.

A morte se liga à perda ou ao desejo, conforme a circunstância. Ou aos dois, por exemplo em Fale com Ela.

A sobrevivência, aprende-se. Em Mulheres à Beira de Um Ataque de Nervos, é bom notar. Pepa está grávida. E reaprende-se sempre, como notam em filmes recentes Leo, Manuela e Marco.

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Os filmes de Almodóvar. O circuito de cinema atual, que precisa convencer o espectador a sair de casa para pagar em média oito reais para ver um filme no cinema, tem hoje no nome de Almodóvar uma grife. As avaliações da grife dão conta do seguinte: os filmes de Almodóvar se domesticaram, não têm mais a mesma dose de transgressão a preconceitos sociais. Mas ficaram mais singelos e comunicativos. Talvez sim, talvez em parte. Essa visão grosso modo aponta a realidade de uma transformação evidente. Mas talvez se possa olhar com mais atenção para perceber o movimento que há entre seus filmes. Porque este movimento na carreira de Almodóvar pode ser visto sob a ótica do contexto a que cada um pertenceu, ainda que isso não deva funcionar como uma chave explicativa de toda a evolução. A obviedade que precisa ser lembrada é que os filmes não surgem do nada, se muda o mundo de que fazem parte, se muda o público que irá assisti-los, mudam os filmes também – não mudam apenas em função disto, claro. Mas pode-se, ao notar este movimento, enriquecer um pouco a compreensão acerca das diferenças entre A Lei do Desejo e Fale Com Ela, para lembrar exemplos extremos. É fácil agora saber o que esperar dos filmes de Almodóvar? Se fosse fácil, ainda seriam importantes ou ainda interessantes?

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Os filmes de Almodóvar. Sabe-se que seus primeiros filmes, curta-metragens feitos em super-8, ficaram célebres no período em que ocorreu a chamada Movida Madrileña, a efervescência social que tomou Madri na época do fim do franquismo. Entre 1974 e 1978, fez onze curta-metragens – seu primeiro filme, de quatro minutos, se chamou Filme Político, e alguns dos títulos dos curtas que vieram a seguir já mostram o ambiente de transgressão em que surgiam: Duas putas ou história de amor que termina em bodas, A queda de Sodoma, Sexo vai, sexo vem, Salomé (adaptação de 12 minutos da peça de Wilde), Fode... fode... fode-me Tim. O primeiro longa-metragem (feito também em super-8!), Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón, representa decerto a primeira ampliação de público – mas seu tom porra-louca já trouxe para o mundo um certo estilo transgressor e escrachado. Mais do que isso, trouxe a disposição para o enfrentamento de preconceitos arcaicos que caracterizaria seus filmes dali em diante.

É preciso que se abra parênteses aqui para lembrar a história espanhola. Francisco Franco subira ao poder em 1937, após uma guerra civil – e, vitorioso, implantou um regime fascista profundamente conservador, que sobreviveu por três décadas à queda dos ditadores que o ajudaram a chegar ao poder, Hitler e Mussolini, tornando a Espanha até certo ponto um país isolado da Europa que se pretendia mais democrática e do resto do mundo. Foi nesse país e neste momento histórico que nasceu e foi criado Pedro Almodóvar, na década seguinte à guerra. Além dos registros do que se fez no período da movida, há nos seus filmes também algumas referências ao que lhe interessava no cinema espanhol que o período franquista estrangulou: os filmes de terror (homenageia Jess Franco em Matador) e Luís Buñuel, talvez sua mais evidente fonte de inspiração (sobretudo o mexicano Ensaio de um crime, que, além de ter um tema próximo ao de Matador, é mostrado numa televisão em Carne Trêmula). Não custa notar que Buñuel rodou somente dois filmes na Espanha, um proibido e outro censurado (no caso, Las Hurdes e Viridiana), além de ter participado da produção do documentário da frente anti-fascista Madrid 1937. Não custa lembrar também que a Espanha de Velásquez e Goya ainda tem reis...

* * *

O rompimento da barreira da exibição restrita do curta-metragem em super-8 aconteceu em Pepi... e se refletiu na proposta do filme seguinte, Labirinto de Paixões – que procura retratar, numa trama chanchadesca e repleta de personagens, aquele certo período em que era concebido. Abrindo-se a ser um registro euforicamente sentimental de uma época, Labirinto de Paixões já nos apresenta Cecilia Roth numa personagem chamada Sexilia (como Pepi já havia apresentado Carmen Maura) e Almodóvar se registra como participante daquele período – como um diretor de foto-novelas e cantor de uma banda de rock performática. Não poderia ser mais pessoal – estava registrando a banda a que pertencia de fato, cantando músicas suas, fazendo performances bizarras no seu próprio longa-metragem. Molecagem bacana, com certeza. Laberinto de Pasiones, mesmo tendo evidentes problemas narrativos (ou, sendo mais claro, tendo uma trama sem importância e sem pé nem cabeça), tem um charme único, é o tipo de filme que poucos podem fazer, que tem algo a mais do que simples idéias, consegue sugerir um certo espírito de vida próprio de um momento. Talvez, sob certo aspecto, seja seu filme mais rico e corajoso. Traz, além disso, um interesse recorrente nos seus filmes: aqui aparece o fascínio pela paixão obsessiva.

Seguiram-se a agressão cômica Maus Hábitos – em que freiras têm as piores, as menos católicas e as mais bizarras atitudes – e Que fiz eu para merecer isso, para já vir à tona uma maestria narrativa impressionante em Matador, onde se define o círculo narrativo constante de seus filmes – transgressão, paixão obsessiva, perda/morte. A Lei do Desejo já repete isto, noutro tom: no que Matador é buñuelesco e hipnótico, A Lei do desejo é melodramático e intenso. Daí estava se processando uma nova e decisiva mudança de alcance de platéias. O cineasta da Movida que se tornara cineasta da Espanha agora era cineasta do mundo – do mundo dos festivais. Seu filme seguinte, Mulheres à beira de um ataque de nervos, ganhou imensa fama internacional e consolidou a imagem do cineasta que fazia filmes engraçados e bem coloridos com personagens latinos apaixonados e exagerados. É só isso Mulheres à beira de um ataque de nervos?

Mulheres à beira de um ataque de nervos talvez seja seu filme mais leve e palatável – não tem morte, a perda é amorosa – e, nesse novo movimento de tom narrativo, encontra-se pela primeira vez a chave final do caminho narrativo: transgressão, paixão obsessiva, perda e sobrevivência. Pepa está grávida.

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Abra-se outro parênteses então para lembrar o que poderia significar esta "imensa fama internacional". Matador já chamara a atenção em festivais, A Lei do Desejo ganhou prêmios e Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos foi um tremendo sucesso. Já existia há pelo menos duas décadas a estrutura de filmes internacionais, aqueles que, sustentados por exibições em festivais e pela divulgação dos nomes de seus atores e eventualmente diretores, conseguem boa distribuição mundo afora, possibilitando ocasionalmente o surgimento de um ou outro grande sucesso de bilheteria. Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos foi um destes sucessos eventuais, criou uma tremenda expectativa sobre o cineasta transgressor e debochado. Alguns riscos desse mercado de cult-movies e festivais é rotular autores (limitar, portanto) e estimular o desenvolvimento de certos cacoetes narrativos – o estilo autoral que caracteriza a carreira de vários cineastas e alegra os fãs nas mostras de cinema. Algo como o excesso de tempero que vicia o paladar (embora a comparação entre cinema e comida não seja das melhores). O risco de defender filmes de autor para se contrapor ao fast-food cinematográfico é que também este cinema pode acabar se tornando um fast-food alternativo, como já se percebeu. Seria bom saber o que esperar dos filmes de Almodóvar?



Ata-me é o gesto final deste momento de conciliação com um certo público internacional. Maestria absoluta na narrativa – a mais simples, até clássica, e a com menos personagens –, bom-humor, latinidade, amor obsessivo levando à transgressão. Um período se fechava – a grife Almodóvar já existia e as platéias ansiavam por mais do mesmo. Começa, até certo ponto, uma crise que aparece nos filmes seguintes, De Salto Alto e Kika. De Salto Alto, ainda que esteja longe de ser um filme sem qualidades, traz um certo conflito de tom – por um lado há um interesse pelos problemas de amor que precisam ser vistos em modo menor, por outro há uma exacerbação do tom transgressor à beira da escatologia. Um tom transgressor que parecia à época remeter mais aos desejos das platéias de festivais do que ao espírito de seus filmes anteriores , ainda que parecesse tatear os limites aceitáveis a estas platéias, mantendo a seu modo o espírito incômodo inicial. Kika leva essa sensação ao extremo – parece um pouco um recado do gênero "vocês querem transgressão e escatologia? – pois aí está". O tom é histérico, as obsessões temáticas são levadas a pontos extremos – a mídia invasiva, constante em diversos filmes, é representada por uma Victoria Abril que carrega uma câmera em seu capacete, o narrador de histórias sujas é um serial killer que mata para saciar o desejo, além do filme ter ficado conhecido por ter um estupro interminável...É quando se desenvolve de forma mais doentia o ciclo paixão mórbida, transgressão, morte e sobrevivência – mesmo essa última, o gesto de generosidade final nos filmes mais bem-sucedidos, é aqui uma fuga sem destino nem responsabilidade ou afirmação pessoal. Se Labirinto de Paixões era um filme problemático amável, Kika é o filme problemático desagradável, incômodo – de certa maneira, um grande elogio à transgressão.















Leo, a escritora interpretada por Marisa Paredes, protagonista do filme seguinte, A Flor do Meu Segredo, diz o seguinte: o problema é de cores. "Vocês querem colorido e tudo que eu escrevo sai negro". Escreve novelas baratas com um pseudônimo, é abandonada pelo marido, tem um texto negado pelos editores por ser muito agressivo e assina uma crítica devastando suas próprias novelas. Quem cuida dela, escreve outra crítica as defendendo e até passa a escrever suas novelas é seu amigo-amor Ángel. Em A Flor do Meu Segredo temos situações e personagens recorrentes que estavam sendo revistos ali – e outros que seriam revistos dali à frente. Leo, a narradora, se reencontra e se reconcilia consigo mesma e com seus propósitos. Daí se seguem Carne Trêmula, Tudo Sobre Minha Mãe e Fale com Ela, até o momento. O melodrama se faz sem pudor, com temas recorrentes (paixão obsessiva, etc, etc) e transmitindo tremendo interesse por seus personagens. Sem pudor tampouco das ligações com o cinema de autor ou qualquer viés besta de mercado: há alusões a clássicos do cinema, há também a incorporação de uma certa arte internacional (de teatro, dança ou música), assim como também há enredos envolvendo problemas de saúde, cheios de situações lacrimosas. Escapar desse pudor faz muito bem aos filmes. Podem voltar a se associar a seus personagens a ponto de compreender suas transgressões – sendo assim, aprende-se a ter dignidade vivendo com uma obsessão amorosa ou com uma deficiência física (Carne Trêmula), com a ambigüidade sexual (Tudo sobre Minha Mãe) ou com novamente a obsessão levando à agressão por desejo (em Fale com Ela). Estas atitudes trazem conseqüências dramáticas, principalmente no último caso, mas o interesse destes filmes é muito mais compreender os sentimentos que levam a isso do que apontar o que é certo ou errado – este olhar generoso é decisivo para este cinema. Se certamente o interesse que temos nos filmes citados é provocado por um brilho narrativo único, característico, com temas, personagens e situações recorrentes, este interesse também se fundamenta nessa generosidade rara que está na origem dessa narrativa.

É um caso, certamente raro, de realizador que, sendo bem-sucedido num certo viés e ganhando prestígio e boa distribuição, soube transformar seu cinema mantendo o que lhe parecia essencial – e tiveram boa receptividade os resultados da evolução que seu trabalho teve diante das circunstâncias. Pelas notícias recentes (neste estágio, ainda incertas), a previsão é de que logo venha aí La Mala Educación. Sabemos o que virá a seguir? Possivelmente paixão, perda, morte, sobrevivência. Mas não, não se sabe o que vem a seguir – a vida muda tudo, e há sempre a sobrevivência a se reaprender, sabe-se lá como...

Daniel Caetano

Labirinto de Paixões é um legítimo Almodóvar


Por Cássia Borsero

O sucesso de Pedro Almodóvar nas telas brasileiras se confirma com mais um relançamento, depois Maus Hábitos e A Lei do Desejo. Labirinto de Paixões, de 1982, é uma deliciosa incursão pelo universo almodovariano, com seus tipos deliberadamente kitsch, comportamentos sexuais incomuns e paixões avassaladoras. Assim como em toda a sua filmografia, a trama de Labirinto de Paixões é movida a sexo e desejo.

A comédia se passa em uma Madri festiva e erótica, onde o filho gay do Imperador da Tirânia, Riza Niro (Imanol Arias), procura um estilo de vida mais liberal, de preferência com grande variedade de parceiros. Acaba esbarrando em Sadec (um ainda imberbe Antonio Banderas), jovem terrorista da Tirânia, que nem imagina estar na cama com o inimigo, apesar de seu olfato apuradíssimo.

Riza se torna vocalista da banda "Eles", conjunto rival de uma banda feminina liderada pela ninfomaníaca Sexilia (Cecilia Roth). Antes do show da "Eles", Almodóvar dá uma canja no palco, com um casaco de couro curto e meias arrastão, além de servir de assistente ao fotógrafo de um dos amantes de Riza durante uma sessão de fotonovelas de horror.

Filha de um famoso e indiferente bioginecologista (Fernando Vivanco), Sexilia detesta a luz do sol e se esbalda em orgias, enquanto tenta descobrir as razões de sua fotofobia com uma psicóloga tresloucada (Ofélia Angélica). Ao conhecer Riza, Sexi cai de amores pelo futuro imperador, que abandona sua opção sexual para se dedicar à ex-nifomaníaca. Antes de fugir com Sexi, Riza ainda se deixa seduzir pela própria madrasta Toraya (Helga Liné), que está na cidade para se consultar com o pai de Sexi.

O labirinto fica ainda mais sinuoso quando Sexi conhece a dona de uma lavanderia, Keti (Marta Fernandez Muro). Keti tenta escapar dos estupros constantes do próprio pai, um pobre alucinado que vê na filha a esposa que o abandonou. Para mudar completamente de vida, ela faz uma plástica e fica igualzinha a Sexi, curando a apatia sexual do doutor bioginecologista. Com sua estética exuberante e variações sexuais, Labirinto de Paixões é uma legítima cria da verve irreverente do cineasta.

Próxima quarta-feira, 01/09 às 19horas na Videoteca João Carriço

Labirinto de Paixões






Foi um sucesso a exibição do primeiro filme de Pedro Almodóvar "Pepi, Luci, Bom" na noite de ontem. A sala teve lotação máxima e muitas pessoas tiveram que se sentar no chão. Nós que estamos a frente deste projeto, ficamos muito felizes de ver a aceitação do público super interessante e diversificado. 


Na próxima quarta-feira será exibido "Labirinto de Paixões", um dos filmes menos conhecidos de Almodóvar no Brasil e, ao mesmo tempo, um de seus trabalhos mais engraçados, misturando elementos do melodrama mais desbragado com situações de humor quase escatológico.




"Labirinto de Paixões" é o segundo longa-metragem dirigido por Pedro Almodóvar. Realizado em 1982, o filme é um típico produto da chamada Movida Madrileña, movimento de renovação cultural que sacudiu a Espanha após os duros anos da ditadura Franco.

Madrid, anos 80. Uma cidade incômoda, selvagem e divertida. Nela acontece uma historia de amor incomum entre uma joven ninfomaníaca e o filho de um imperador árabe. Ela, membro de um violento grupo musical, e ele, preocupado em se manter escondido de terroristas de seu país de origem, são o fio condutor de uma série de relações entre os personagens mais díspares que se pode encontrar. Música, violencia verbal, perseguições, paixão, sexo... e acima de tudo, o amor e suas dificuldades.

Se você gosta de filmes e escrever sobre eles, mande seus textos para bordelsemparedes@gmail.com que a gente publica em nosso blog. 


"Labirinto de Paixões" Quarta-feira 01/09 - 19 horas na Videoteca João Carriço




terça-feira, 24 de agosto de 2010

Conheça as musas de Almodóvar




PENÉLOPE CRUZ
Penélope Cruz e o mais recente filme do cineasta, Abraços Partidos, que estreia na sexta-feira. A espanhola vive uma aspirante a atriz Lena, cujo passado com um diretor de cinema (amante) e um empresário ricaço (marido) guarda segredos assombrosos





CARMEN MAURA
Carmen Maura em A Lei do Desejo. No longa, ela interpreta Tina, que, na verdade, é um transexual e irmão de um cineasta. Sua personagem serve de ponte para as paixões tresloucada do irmão (enquanto tem suas próprias paixões ensandecidas)




VERONICA FORQUÊ
Falando em tresloucada, Veronica Forqué interpreta uma maquiadora maluca e gente boa em Kika. Além de ser acelerada, ela tem o talento de cair em relacionamentos que se revelam verdadeiras ciladas.






ROSSY DE PALMA
Nem um pouco gloriosa é a beleza da catalã Rossy de Palma, coadjuvante em cinco filmes do cineasta espanhol. Seu nariz vultoso e queixo avantajado seduziram o cineasta em A Lei do Desejo, Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos, Ata-me, Kika e Abraços Partidos.







ROSÁRIO FLORES
Rosario Flores fez apenas um filme com Almodóvar: nada menos do que Fale Com Ela, que rendeu ao cineasta o Oscar de Melhor Roteiro (sem contar o primor da beleza pictórica). Flores interpreta a toureira Lydia González, cuja história de desgraça será responsável pelo encontro de dois personagens: o escritor Marco (Darío Grandinetti) e o enfermeiro Benigno (Javier Câmara).




VICTORIA ABRIL 
Almodovariano é o universo do desejo desmedido de Ata-me. A diva da vez é Victória Abril, que interpreta Lola, uma atriz pornô. O inusitado é Ricky (Antonio Bandeiras) sequestrá-la para, com o tempo de cativeiro, mostrar que ele é o marido ideal para ela. 


Entrevista de Pedro Almodóvar no Roda Viva

Ele é o cineasta espanhol mais importante da atualidade e veio ao Brasil para lançar, na Mostra de Cinema de São Paulo, o seu mais recente filme. Na “lei do desejo e dos segredos” do Roda Viva está Pedro Almodóvar.


















Mulher revoltada tem ataque de nervos, uma não, três. Órfão sai do hospício e rapta uma atriz pornô. Apresentadora confessa crime na televisão. Advogada mata os amantes na hora do orgasmo. Maquiadora é estuprada e tem vontade de espirrar. Cenas de Madri, personagens de Almodóvar, “almodramas”. Almodóvar não é só melodrama nem só escândalo e, muito menos, perversão. Suas fantasias querem ser coisas normais, seus personagens amam e matam, porque não existe pecado, só a “lei do desejo”, força trágica, irresistível. Almodóvar é quase sempre drama. E o desejo também é a lei do cinema, pelo menos desde que ele começou a filmar nos anos 70, impulsionado pelas movidas madrileñas. Antes do cinema um outro emprego, na Telefônica de Madri, doze anos falando ao telefone, observando a classe média baixa espanhola e, nas horas de loucura, um excesso de criatividade, fotonovelas pornôs, teatro alternativo, shows de travestis, exatamente o mesmo universo de seus filmes, marginal e irreverente, livre e cheio de intensidade. É esse o caos que ele leva para o cinema, às vezes de forma sombria como em O matador, de 85, um filme onde a paixão vira obsessão, amor e morte. Anos depois, a reviravolta, com Mulheres a beira de um ataque de nervos vem o sucesso, tão odiado por ele, prêmios internacionais e a briga com Carmen Maura a atriz inseparável dos primeiros filmes. Se Mulheres foi até indicado ao Oscar, Ata-me só causou escândalo. Onde Almodóvar via apenas um filme puro e romântico os americanos enxergaram uma obra pornográfica, inclassificável. De salto alto foi a segunda parceria do diretor com a atriz Victoria Abril, um filme diferente, intrigante, citando Bergman na relação desencontrada entre as duas personagens, mãe e filha. Para encarnar dramas e sentimentos profundos, os atores de Almodóvar têm que ser fortes [trecho de entrevista com Victoria Abril falando disso]. Kika é uma personagem ingênua, otimista, mas o que deveria ter sido uma comédia leve, acabou virando um filme ácido, um estudo perverso sobre o voyerismo, a televisão, o comércio do sangue e da tragédia, figurinos de Gaultier embalando o mundo cão. E agora, cansado de escandalizar, Almodóvar chega com o intimista A flor do meu segredo, o mais autobiográfico de seus filmes. No lugar das cores fortes, um drama seco. Trágico, cômico, cruel, bem humorado, racional e irracional, kitsch, extravagante, surpreendente, terno e radical, Pedro Almodóvar, 44 anos, espanhol!

Matinas Suzuki: Bem, para entrevistar o cineasta Pedro Almodóvar, nós convidamos, esta noite, o cineasta André Klotzel; o jornalista Marco Antônio Rezende, diretor de redação da revista Vip-Exame; o Sérgio Augusto, que é jornalista e crítico de cinema da Folha de S. Paulo; a atriz e roteirista Patrícia Travassos; o produtor cultural Leon Cakoff, diretor da Mostra Internacional de Cinema; a Lorena Calábria, que é apresentadora do programa Metrópolis da Rede Cultura de Televisão; e o jornalista Luís Zanin Oricchio, crítico de cinema do jornal O Estado de S. Paulo. O Roda Viva é transmitido em rede nacional com (.....) e nós lembramos que hoje não teremos perguntas dos telespectadores porque este programa foi gravado. Boa noite Pedro Almodóvar!

Pedro Almodóvar: Boa noite!

Matinas Suzuki: Como está você se sentindo nessa segunda viagem ao Brasil? Se é que você já teve tempo de ter alguma impressão do país.

Pedro Almodóvar: A verdade é que não tive muito tempo. Apenas para uma primeira impressão do Festival e sobre a recepção do meu filme A Flor de Meu Segredo em sua projeção de ontem. Mas, 24 horas é pouco para quem acaba de chegar.

Matinas Suzuki: Antes de falar um pouco sobre o seu novo filme, eu gostaria de perguntar o seguinte: nós brasileiros, sempre nos sentimos muito à vontade vendo os seus filmes. Nos parece sempre uma coisa muito familiar, embora a realidade seja a realidade espanhola. Mas seja na caracterização dos personagens, seja na maneira como você dirige, seja na maneira como você usa a música, tudo isso, como você usa o humor, no Brasil a gente fica muito à vontade com os seus filmes e eu tenho a impressão que o Brasil deve ter sido um dos primeiros países a reconhecer a importância do seu cinema. A que você atribui isso?

Pedro Almodóvar: Bem, pode ser porque eu sou um ser humano e, no Brasil, vocês também são seres humanos. Quero dizer que pertencemos à mesma espécie animal. Provavelmente, este é um dos elementos de identificação. Naturalmente, outro fator é a língua. Mas, os outros povos todos da América Latina estão mais próximos do espanhol do que vocês, já que o idioma de vocês é o português. Então, não temos que pedir perdão a vocês, pois não foram os espanhóis que conquistaram o Brasil. É para mim um alívio não ter que pedir perdão. A língua é suficientemente próxima para que me entendam. Além disso, há uma questão, que não é geográfica, nem histórica, uma vez que a história do Brasil evoluiu fora da influência do império espanhol. Eu acredito que seja, basicamente, uma questão de sensibilidade, que é quase mais importante do que a história, do que a língua e a cultura. Existe uma sensibilidade comum entre nós, que tampouco sei de onde vem. Além do mais, é uma sensibilidade natural. Eu tenho um caráter barroco, tenho um critério sobre a cor que se parece muito com o de vocês. Creio que é por aí. Ainda que esta apresentação [refere-se à apresentação dele feita pela comentarista no início do programa], de voz feminina, fosse realmente provocadora [risos], eu sou uma pessoa mais simples do que disseram, pois, em meu cinema, não tanto em minha vida, mas em meu cinema, há uma enorme presença do irracional, do exagero. Um certo tipo de absurdo, que acho que não existe também por aqui. É a impressão que tenho, embora não tenha muita experiência, pois estive aqui apenas quatro dias em minha visita anterior. Mas, creio que talvez na vida brasileira também haja a presença do exagero e do absurdo, e que tudo isto provavelmente faça com que compreendam melhor os meus filmes. É por isso que o Brasil é um dos países onde lançam meus filmes antes.

Matinas Suzuki: Sobre o seu novo filme A flor do meu segredo, que está sendo lançado agora no Brasil, a crítica, os artigos e o que se falou sobre o filme, seria de que esse é um filme mais sério de Pedro Almodóvar. E você tem dito que embora seja um filme mais sério, você também se reconhece nesse filme. Como é que você vê essa questão de ser mais sério, ou se é mais engraçado, ou se isso é verdade...

Pedro Almodóvar: Só me cabe qualificar meus filmes, meu trabalho, minha vida inclusive, como coisa séria ou humorada. É que ambas as coisas estão unidas. Todos os meus filmes foram feitos com muita seriedade, e em todos há uma grande presença do humor. É que o humor não está em conflito com a seriedade, nem a seriedade é uma atitude, nem um estado de espírito, nem uma vontade de mudança. A seriedade está nas intenções. E as intenções já são, há muito, sérias. Significa que quando conto uma história, faço do modo mais sincero e de todo coração. Acontece que as histórias podem ser divididas em gêneros, podem ser classificadas conforme o seu tom. As minhas, reconheço que são difíceis de classificas, pois misturo quase todos os gêneros. Tenho também uma natureza eclética. E passo do drama à comédia, e daí ao thriller, ou do thriller ao musical, num mesmo filme. À diferença dos outros, A flor do meu segredo é um filme basicamente dramático, com menos mistura de gêneros e onde o humor está menos presente. É uma opção narrativa que fiz antes de começar a rodar. Como disse, trata-se de uma opção estética. Portanto, a mudança, nesse filme decorre da própria mudança de gênero, pois queria fazer um drama. E também percebi que devia contar essa história em tom sóbrio, transparente, econômico e austero. Não porque tenha me tornado sóbrio, austero, etc. Nem significa que, a partir de agora, todos os meus filmes serão sóbrios. Caí na tentação da sobriedade, como caí em outras tentações. E porque, para mim, era algo novo. Mas, esse filme me representa do mesmo modo que todos os meus filmes anteriores. E também nesse filme também há humor. Acontece que, por baixo das emoções, há uma história mais cheia de dor que de humor.

Ler entrevista na íntegra

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Comentários...Twitter























Syl
O que foi o primeiro dia da "Essência de Almodóvar"? Divino! @cineclubebordel está de parabéns!

Su Mohamad  
A abertura da mostra Almodóvar ontem realizada pelo @cineclubebordel foi bem legal! Mulheres a beira de um ataque de nervos!Engraçado demais.

Rafael Costa 
Foi ótima ontem a Mostra "A Essência de Almodóvar", promovida pelo @cineclubebordel. Estão de parabéns!

Ana Loureiro
A estréia da mostra "A essência de Almodóvar", do @cineclubebordel foi um sucesso. O público lotou o anfiteatro. Parabéns Wesley e Daiverson.

Jemima Bispo 
Parabéns aos idealizadores do CineClube!!! Inauguração fantástica ontem com o filme #Mulheres à beira de um ataque de nervos..



sábado, 21 de agosto de 2010

Mais falado

O assunto mais falado dessa semana no Zine Cultural foi a exibição de "Mulheres à beira de um ataque de nervos"



Zine Entrevista Wesley Conrado

O Cineclube Bordel sem Paredes está bombando, esta semana, um dos criadores deste bordel concedeu uma entrevista super bacana no Zine Cultural.  


    

Três jovens unidos pela paixão ao cinema. Gian Martins (Juiz de Fora), Wesley Conrado (Joinville/SC) e Daiverson Machado (São João Nepomuceno/MG) estão à frente do CineClube Bordel Sem Paredes, um projeto cultural independente, que divulga, exibe e discute o fazer cinematográfico. O nome Bordel Sem Paredes gerou muitas discordâncias, mas acabou  emplacando e deu certo. A ideia é um lugar onde se possa mostrar tudo o que está escondido. Abaixo a caretice! Salve, salve liberdade, diversão e prazer!

Como é o processo de produção de uma Mostra, desde sua idealização até o momento de sua execução?


Da forma como estamos fazendo é muito simples, porém trabalhoso. Escolhemos um tema que achamos que é de interesse popular mas que não seja TÃO popular, e dentro deste tema pegamos os filmes menos conhecidos e mais expressivos. Foi assim com o Almodóvar, que é um diretor relativamente conhecido hoje em dia. Já temos o espaço da Funalfa (levou um tempo para conseguirmos, precisamos fazer reuniões, foram muitos telefonemas e troca de emails), o mais difícil é divulgar. Temos o blogbordelsemparedes.blogspot.com e o twitter @cineclubebordel, mas isso não basta. É preciso ir aos lugares pessoalmente, conversar com as pessoas, isso toma tempo e é cansativo, mas o projeto está crescendo, pessoas interessantes e interessadas estão entrando para nos ajudar.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Fotos

A exibição da última quarta-feira de "Mulheres à beira da um ataque de nervos" foi um sucesso, o público que lotou a Videoteca João Carriço se divertiu e aplaudiu ao final da sessão.

Vejam as fotos de Gian Martins.































Não percam na próxima quarta-feira "Pepi, Luci, Bom e outras garotas de montão", primeiro longa de Pedro Almodóvar, filme inédito no Brasil, às 19hrs na Videoteca João Carriço.  


Pepi tem sua virgindade rompida por um policial ao tentar suborna-lo para evitar ser presa por possuir plantas ilegais de maconha em seu apartamento. A garota, então, busca vingar-se com ajuda de sua amiga Bom e seus amigos Punks. Neste processo, acabam conhecendo Luci, esposa sadomasoquista do policial. Unidas, Pepi, Luci e Bom passam por diversas situações no cenário underground das noites de Madri.


O roteiro surgiu originalmente sob o título 'Erecciones Generales', idealizado como uma fotonovela para uma publicação underground e foi adaptado a roteiro cinematográfico por incentivo da atriz Carmen Maura, que participava do mesmo grupo de teatro que Almodóvar, a companhia Los Goliardos. Foi filmado com um orçamento de meio milhão de pesetas, obtidas sobretudo através de empréstimos, durante um preíodo de um ano e meio com uma equipe de voluntários, trabalhando sobretudo aos fins de semana. Antes de Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón, Almodóvar só tinha realizado gravações em formato 8 mm, de pouca notoriedade mesmo nos meios underground, de forma que, sendo gravado em formato 16 mm, este foi seu primeiro filme comercialmente exibido.

O retrato da essência humana - Um ensaio sobre a filmografia do cineasta Pedro Almodóvar
































Quando se pensa em Almodóvar, e tenta-se teorizar ou postular alguns tópicos sobre sua obra, chega-se a conclusão de que não há tópicos, ou pontos, ou aspectos determinados. Há, sim, uma fusão de idéias e sensações. Pensar na obra almodovariana é o mesmo que tentar encontrar algo da essência humana, se é que isso seja possível de ser determinado. É ir em busca de uma verdade não única, mas plural. Uma verdade que caiba em todos - digo, todos os sexos, todas as escolhas, todas as interpretações e, acima de tudo, todas as vivências. É descobrir que não há sujeitos absolutos, porque o sujeito é para lá de dissipado.
Para entender o que esta busca almodovariana quer dizer, tentaremos separar ao máximo os aspectos principais de sua obra - aspectos tão truncados e fundidos.

Observamos que em sua filmografia há uma linha coerente que torna verdadeiro, ou melhor, verossímil não apenas seu enredo, mas também seus personagens. As questões tratadas são sempre de ódio e paixão - sem meio termo, num mundo possível apenas dentro da lógica de Almodóvar.

Quando começa a escrever um filme, o diretor parte de uma cena central que funciona como o centro de um redemoinho. É a partir daí que surge o resto do roteiro que não é, necessariamente a cena dos coadjuvantes. Na verdade, poderíamos tratar vários personagens como protagonistas em seus filmes, considerando a importância e a riqueza de detalhes que há em cada um deles. Almodóvar é considerado um "reescritor nato de seu próprio material", na medida em que chega a desenvolver várias versões de uma mesma história, até se encontrar realmente seguro com o que tem em mãos.

Antes de começar a rodar o filme, ele estuda o próprio roteiro de uma forma tão intensa que conhece e trata seus personagens como se fossem reais - não como meros veículos através dos quais sua história virá a ser contada. Sabe exatamente como falam, como se movem, o que sentem. Personagens que passam a ter vida própria.

Sua obra pode ser definida como híbrida, uma vez que é duplamente tragicômica e melodramática. Com a mistura de gêneros, ele reforça a sensação que dá mais importância em seus filmes: a ênfase na emotividade. Os sentimentos e as emoções determinam pontos extremos nos enredos que são, acima de tudo, paródias da sociedade pós-moderna.
















Seu trabalho funciona como uma crítica à sociedade da forma mais irreverente possível, podendo ser relacionado com cineastas como Bergman ou Buñuel. Um aspecto marcante desta paródia é o encontro - e/ou desencontro - sexual como este se dá atualmente. Sua obra é, claramente, uma "crônica da carne trêmula" a partir de idéias originais e provocantes.

Um dos elementos mais sedutores em Almodóvar é, sem dúvida, a cor. Conta-se a história que sua mãe vestiu luto desde os três anos, na morte de seu pai, até o nascimento de Pedro. A partir daí, ela nunca mais vestiu roupas escuras. Segundo entrevista dada pelo cineasta, este fato foi considerado por ele como sendo a causa primeira de sua relação tão intensa com o cromatismo: "Depois de tantos anos de escuridão, minha mãe representa a vingança contra o negro. Eu decidi que minha vida estaria determinada pela cor, que se experimenta pelo excesso de cor". Em filmes como "Mulheres à beira de um ataque de Nervos", "Ata-me" e "De Salto Alto" são a prova concreta desse excesso de cores kitsch, vivos e marcantes. Vermelho, azul, laranja, rosa e verde se fundem em uma desordem com manifestações geométricas, trazendo à tona quadros de Mondrian ou Gatti. Em Almodóvar, a intertextualidade entre a pintura e a linguagem cinematográfica tende a abolir a existência de fronteiras entre essas disciplinas. A linguagem visual é tratada cada vez mais como una, caracterizando os extremos das sensações.

Por todas as questões mencionadas e pelo que sentimos ao assistir um filme deste diretor, sabemos que ele tenta fazer com que os espectadores vivam as emoções que se encontram em questão. E que, geralmente, são emoções femininas. Seu ponto de vista não é androcêntrico - fato inédito em se tratando de diretores masculinos. Em "Tudo sobre minha mãe", ele quase que reduz os homens à marginalidade. "Matador", "A lei do desejo" e "Carne Trêmula" são seus únicos filmes denominados, por ele, de testiculares. Apesar de que, neste último, as ações ocorrem em função das mulheres. Inversão de sexos - esta é a semente da paródia espanhola.

Especialista em registrar um retrato feminino emotivo, desesperado e ambíguo, a heroína almodovariana geralmente é uma figura tragicômica vivendo situações de traição e abandono, em um estado de solidão, sofrimento e desespero. Como mulheres espanholas, suas questões dramáticas se dão ao ritmo do bolero. Ritmo que determina o exagero dos sentimentos com sua melodia cálida, compensando todo e qualquer sofrimento.

Para o cineasta, a mulher tem um interesse em ser um sujeito dramático, afirmando que "Os homens também choram, mas penso que as mulheres choram melhor. Elas não conhecem nem o pudor nem o sentido do ridículo, nem essa coisa horrível que chamam de amor próprio". Eles as escolhe como representantes na busca da essência humana - onde, quem sabe, pode estar a verdade. A busca que sempre fez parte do homem, como comprova a inscrição no templo do deus grego Apolo, "Conhece-te a ti mesmo" - entenda seus limites, tenha consciência de si.

Almodóvar emoldura um povo tentando resgatar a consciência de si. Tentado resgatar as questões culturais, políticas, sociais. A transição de uma Espanha franquista para uma Espanha que valoriza a diversidade - a identidade do homem pós-moderno. A vontade de beber, cantar e dançar - símbolos da era liberdade pós-franco. Seu apogeu é retratado em "Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón". Em "Carne Trêmula" temos as menções à ditadura que acabava de cair, exercendo o papel de prólogo ao entendimento do comportamento da sociedade na denominada 'movida madrileña'.

Ao mostrar a sociedade espanhola em sua busca pela identidade ou o homem em busca de respostas para suas questões, Almodóvar não poderia ser mais verdadeiro. É a síntese da representação da busca humana. A busca do sonho, da essência. A procura por pessoas que nos entendam, que compreendam nossos desejos. Que compartilhem sentimentos, que vivam demasiado. "Uno es más auténtico cuanto más se parezca con lo que se sueña de si mismo", disse seu personagem Agrado em "Tudo sobre minha mãe". Verdade seja dita, autenticidade que a gente bem que tenta encontrar.

Pepi, Luci, Bom e outras garotas de montão

Na próxima quarta-feira, dia 25,  vai acontecer a segunda sessão da Mostra "A Essência de Almodóvar" com o raro primeiro filme do diretor espanhol "Pepi, Luci, Bom e outras garotas de montão". Logo após debate com o jornalista Gabriel Fortes. Não Percam!

Inédito no Brasil, "Pepi, Luci, Bom e outras garotas montão" representa muito bem a fase inicial do trabalho de Almodóvar, cheia de personagens marcantes e absurdos, embora muito humanos. O próprio diretor atua no filme, e apresenta um elenco que o acompanharia em diversos de seus filmes seguintes, como Carmen Maura, Cecília Roth, Cristina S. Pascual, entre outros. Vale a pena reparar no trabalho de Eva Siva, que representa Luci neste filme, tendo participado em outros papéis muito cômicos com Almodóvar.

Após um ano e meio de difícies filmagens em 16mm, ele estreou, em 1980, seu primeiro longa, Pepi, Luci, Bom y Otras Chicas del Montón (1980). Desde então filmar se tornou sua segunda paixão. Ele escreve e dirige. E vive, o suficiente pelo menos para ser capaz de inventar estórias que são vivas. Seus filmes são exibidos em todo o mundo.


















Pepi é uma garota moderna, esperta e irreverente que vive perto da casa de Luci, que é casada com um policial. Trata-se da típica dona-de-casa quarentona, abnegada e submissa.
Mas por trás dessa aparência insignificante esconde-se um segredo. Bom é a vocalista de um grupo pop, "El Bomitoni". É violenta, perversa e muito jovem. Um acontecimento inesperado (o policial violenta Pepi em troca de manter-se calado sobre a plantação de maconha que ela tem em sua varanda) muda o destino das três mulheres e do policial.


quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Cartaz


Almodóvar Fashion

A edição de março da Harper’s Bazaar, está homenageando o cineasta Pedro Almodovar que além de amar o cinema entende muito bem sobre moda.

A revista fez uma edição de releituras de cenas famosas dos filmes do cineasta. E os modelos são nada mais nada menos que - Karl Lagerfeld aponta uma arma em cena de “Carne Trêmula”, Sonia Rykiel posa com a filha Nathalie, recriando o pôster de “Mulher à Beira de um Ataque de Nervos” e Jean Paul Gaultier vive o padre de “Maus Hábitos” ao lado de Mariacarla Boscono. As fotos são de Jason Schmidt e o styling de Katie Mossman.








































Almodóvar - Mundo falocentrico, Utopia Feminina por Julio Zanin
















Pedro Almodóvar é, num primeiro momento, o cineasta do pós-franquismo, da Espanha moderna, que se desrecalca depois de uma longa e moralista ditadura. É, como já se disse, o cineasta da “movida”, da farra da Madri liberada, mas, de maneira mais profunda, da abertura do país a toda a sorte de influências, antes filtradas pela alfândega censória do generalíssimo.

Anárquico e libertário, Almodóvar pôde ser moderno sem jamais deixar de ser profundamente espanhol. Divulgou uma Espanha colorida, fortemente melodramática e picaresca em filmes como Pepi Luci Bom (1980), Labirinto de Paixões (1982) e Maus Hábitos (1983), para citar alguns dos títulos mais conhecidos dessa primeira fase. Nela, o anticlericalismo radical (só acessível a quem foi criado em ambiente puritano) une-se à questão urgente do sexo. E, posteriormente, do desejo, tratado de maneira mais ampla em Matador (1986), A Lei do Desejo (1987) e Ata-me (1990). Interessa a Almodóvar esse impulso paradoxal do desejo humano, que força os limites do socialmente conveniente e é própria afirmação de vida, mas também do seu contrário, a morte, a extinção do ser. Eros e Tânatos, segundo o jargão da psicanálise.
Nesse universo ambivalente, não faltam personagens homossexuais, bissexuais, travestis, transexuais e mesmo heteros. A pulsão humana não se resume aos interesses da reprodução e da continuação darwinista da espécie, e Almodóvar coloca no centro da sua cinematografia esse caótico Eros humano que explode em todas as direções e em todas as formas, até mesmo na sua inversão mais radical, a morte. Seus filmes se desenrolam nesse universo multissexual, colorido, vibrante, nas cores da paixão e das variações possíveis em torno da ciranda amorosa.

                                                                                                                                                                  
Mas, fora isso, como numa espécie de círculo concêntrico, Almodóvar revela-se extraordinário conhecedor
da alma feminina, e apologista de um tipo particular, a mulher latina. Suas atrizes favoritas logo passaram a usar o adjetivo de “almodovarianas”, tamanha a identificação com o projeto artístico e existencial do cineasta – Carmen Maura, Victoria Abril, Rossy de Palma, Marisa Paredes, e, agora, Penélope Cruz que, com ele em Volver (2006), desabrochou, perdeu aquele ar de chatinha e assumiu-se exuberante. O interessante é que o Almodóvar anárquico dos primeiros filmes e, em especial, do grande sucesso Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos (1988), sofre mutação sutil em sua fase mais madura. Sem nunca perder o gume crítico e a alma libertária, passa a imprimir tom mais terno a seus filmes. Como esquecer, por exemplo, o final de A Flor do Meu Segredo, com a música de Tonada de Luna Llena (cantada por Caetano Veloso), que acompanha o espectador como se o embalasse em doce conforto depois de tudo que lhe fora servido ao longo da trama? Ou o tom caloroso de Fale com Ela, um dos seus mais belos títulos recentes?

Neste, em meio a uma história como de hábito conturbada, o personagem Benigno (Javier Câmara) insiste que se deve conversar com as pessoas, mesmo com pacientes em coma profundo. É um patético apelo à comunicação neste mundo de balbúrdia em que as pessoas, por paradoxo, tendem a se isolar umas das outras. O cinema de Almodóvar, terno, caloroso, vibrante, ensaia um movimento em sentido contrário. Sem nunca ser diretamente político, ainda assim ele o é, ao se abrigar no vital universo feminino, refúgio para um mundo masculino e árido – mesmo que nesse mundo real as mulheres tenham participação cada vez maior, desempenhando seus novos papéis de maneira máscula.
É desse mundo ainda falocêntrico que Almodóvar faz a crítica mais consistente do cinema atual. A cumplicidade entre as suas mulheres, a maneira prática e ao mesmo tempo suave como enfrentam as contingências da vida, da doença e da morte, apontam, no pós-socialismo real, para um outro tipo de utopia contemporânea.
(Cultura, 22/3/09)


Mulheres à beira de um ataque de nervos - Quarta-feira -18/08 - Videoteca João Carriço
Assistam ao trailer



quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Mostra "A Essência de Pedro Almodóvar"
























Para dar início oficial às atividades deste “Bordel”, nós do Cineclube escolhemos o mais brega entre os chiques dos cineastas contemporâneos. Ele trabalhou 12 anos numa empresa de telefonia, teve uma banda de “glam rock” e fez teatro experimental, hoje é o cineasta espanhol mais reconhecido do mundo, Pedro Almodóvar. 


O artista se destacou durante os anos 70, quando foi figura importante do “La Movida Madrileña” movimento de renascimento da cultura espanhola após a queda do Regime de Franco, fazendo curtas-metragens em super-8 e sempre tocando em temas controversos como sexo, drogas e religião. Mas foi apenas no final dos anos 80 que ele ganhou destaque mundial com o histérico “Mulheres à beira de um ataque de nervos”.






































Por isso, nós do cineclube nos perguntamos: “O que Almodóvar fez durante todo os anos 80 antes do sucesso internacional?” Oras, eles fez filmes! Claro! E são seus filmes mais coloridos, vibrantes, histéricos, eloqüentes, melodramáticos, “junkies”, cheios da energia do início da carreira, bordados com o que há de melhor da música popular espanhola, vividos por personagens femininos marcantes cheias de paixão e desejo e homens em crise existencial. Nesta mostra exibiremos além de “Mulheres à beira de um ataque de nervos”, “Pepi, Luci e Bom e outras garotas de montão” (filme nunca lançado no Brasil), “Maus Hábitos”, “A Lei do Desejo”, dentre outros.

                                          

















Nunca ouviu falar destes filmes e nem sabe quem é Pedro Almodóvar? Então esta é a maior razão para você não perder esta mostra! Você já viu todos esses filmes? Então essa é a sua chance de revê-los em tela grande!

Extra! Extra! Extra!

No dia 25/08 haverá sessão especial do filme "Pepi, Luci, Bom e outras garotas de montão", após o filme, debate com Gabriel Fortes, estudante que está terminando um trabalho acadêmico sobre Pedro Almodóvar.


“A essência de Pedro Almodóvar”


Quartas-feiras de Agosto e Setembro, a partir do dia 18 (exceto 22/09)


Horário: 19h


Onde:  Anfiteatro João Carriço – Funalfa


Avenida Rio Branco 2234 – Centro – Parque Halfeld


Entrada Franca.