terça-feira, 21 de setembro de 2010

A Lei do Desejo - Almodóvar Cru e Mordaz











































Um dos melhores filmes do consagrado cineasta espanhol Pedro Almodóvar, vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro por "Tudo Sobre Minha Mãe", "A Lei do Desejo" é um filme instigante que ultrapassa todos os limites da sexualidade, uma característica recorrente do diretor. Antonio Banderas ("A Máscara do Zoro") faz um jovem obcecado pelo diretor de cinema interpretado por Eusébio Poncela ("Matador"). A paixão entre os dois irá se transformar em uma trama de assassinato e desencontros. Destaques também para a genial atuação de Carmen Maura ("Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos") como a irmã transexual do personagem de Poncela e para a trilha sonora, que contém temas compostos pelo próprio Almodóvar, "Ne me quitte pas", clássico de Jacques Brel na voz de Edith Piaf, e até trabalhos de Stravinsky e Shostakovich.

Um dos idealizadores do cinema moderno espanhol, Pedro Almodóvar aposta num tema controvertido no seu sexto filme. Uma trama que explora o universo masculino no limiar entre a sexualidade e a morte; no limite entre o amor e a obsessão. 
Em meio a um cenário undergorund e barroco, a tragédia de paixão e ódio contada por Almodóvar começa quando um diretor de cinema homossexual, apaixonado por um rapaz que não o ama, conhece um jovem, que fará de tudo para ter o seu amor, até mesmo matar quem ouse desafiá-lo. 
Nessa trágica história de amor as referências ao comportamento masculino são freqüentes e os personagens, principalmente o irmão travesti do diretor, vivido pela fantástica Carmen Maura, forçam o espectador a rever o seus conceitos sobre paixão e sexualidade, levantando questões polêmicos como: você mataria por amor? Ou ainda, você amaria alguém que se julga capaz de matar? 
A Lei do Desejo ganha por sua originalidade e por sua falta de presunção, o que o torna mais que interessante. Sem qualquer comparação, é um filme intenso, instigante e poético.



QUARTA - 29/09 ÀS 19H NA VIDEOTECA JOÃO CARRIÇO

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Matéria

Matérias da estudante de jornalismo Jemima Bispo, feita para o Jornal do CES, sobre a primeira a segunda sessões do Cineclube





MOSTRA DE CINEMA 


Filme de Pedro Almodóvar marca início das atividades do Cineclube.
Aproximadamente 80 pessoas prestigiam o trabalho do cineasta espanhol através do projeto do grupo Bordel sem Paredes na Funalfa


No dia 18 de agosto, às 19 h, cerca de 80 pessoas assistiram gratuitamente ao filme “Mulheres à beira de um ataque de nervos” no anfiteatro João Carriço (Funalfa).
A exibição marcou a estreia da mostra de cinema “A essência de Pedro Almodóvar”, idealizada pelos integrantes do Cineclube Bordel sem Paredes, Wesley Conrado, Deiverson Machado, e Gian Martins.

O objetivo da mostra é exibir e discutir a cultura cinematográfica referente às produções de diversas partes do mundo. Segundo Wesley Conrado, a ideia de apresentar filmes que não compõem o cenário fílmico tradicional surgiu através de um desejo particular. “Gosto de ver filmes bons, independente de quando foi feito ou em qual idioma, e quero que outras pessoas também vejam coisas boas.” Wesley é estudante de Gastronomia e se mudou para Juiz de Fora recentemente. Ele afirma que não percebe muitos projetos neste âmbito acontecendo em Juiz de Fora, mas acredita na existência de um público interessado e curioso. “Vejo um campo vasto a ser explorado”,acrescenta.         


Gian Martins, integrante do grupo Bordel sem Paredes, afirmou que se surpreendeu com o número de pessoas presentes. “A princípio imaginei que não fosse estar tão cheio, por isso fizemos bastante divulgação. Quando comecei a perceber a receptividades das pessoas, vi que poderia dar certo. Mas ver a sala lotada, realmente foi além do esperado”.
Entre o público, estavam também alunos dos cursos de comunicação de algumas instituições da cidade. Apesar das apresentações serem abertas a todos os interessados, a equipe não nega a intenção de atingir os universitários da área de comunicação. “Queremos que toda a cidade venha prestigiar os filmes que exibimos, mas o foco é nos estudantes. Queremos ainda que se conheçam, troquem idéias e produzam coisas juntas”, afirma Wesley.


O Anfiteatro João Carriço foi cedido pela Funalfa para a exibição dos filmes durante a mostra e, no evento de inauguração, contou com a presença do Produtor de Audiovisual do Depto de Cultura, Daniel Correia.  Ele parabenizou a iniciativa do grupo e ressaltou a importância do projeto para o incentivo à cultura.


Durante os meses de agosto e setembro ainda serão exibidos os filmes Pepi, Luci, Bom e Outras Garotas de Montão - 25/08, Labirinto de Paixões – 01/09, Maus Hábitos – 08/09, Que fiz para merecer isto? -15/09, A lei do desejo – 29/09. Todos do espanhol Pedro Almodóvar.


A equipe ainda não divulgou quem será o próximo cineasta a ganhar uma mostra no cineclube, mas já se adianta em informar que haverá a possibilidade do público decidir através de votação no blog Bordel sem Paredes (http://bordelsemparedes.blogspot.com/). Provavelmente irão entrar na disputa nomes conhecidos como Tim Burton, Martin Scorsese, David Lynch, Gus Van San e Woody Allen para disputarem a preferência do público.


Os filmes vão ser exibidos no Anfiteatro da Funalfa, às 19h, às quarta-feiras entre os dias 18/08 e 15/09. A entrada é franca.


MOSTRA DE CINEMA


Debate marca segundo dia da mostra cinematográfica “A essência de Almodóvar”
Cerca de 90 pessoas assistem e debatem filme do artista espanhol nunca exibido no Brasil em circuitos tradicionais de cinema



O público novamente enche o anfiteatro João Carriço (Funalfa) para assistir a mais uma exibição na Mostra de Cinema “A essência de Almodóvar”, estreada dia 18 deste mês. Na noite da última quarta-feira, 25, o filme apresentado foi “Pepi, Luci, Bom e outras garotas de montão”, visto por cerca de 90 pessoas.O filme coloca em xeque os valores sociais da época, retratando de maneira contundente e satírica questões como a busca pela liberdade sexual, o uso de drogas e o papel da mulher na sociedade espanhola da década de 80. O período foi marcado por restrições e instabilidades geradas pelo regime ditatorial.

A obra não chegou a ser exibida nos circuitos cinematográficos tradicionais e, por isso, chamou ainda mais a atenção do público que, na ocasião da mostra, puderam apreciar o trabalho do cineasta Pedro Almodóvar. O professor de Língua Portuguesa, João Luiz Alvarenga, presente pela segunda vez no evento, confessa sua admiração pelo filme e diz que vem aprendendo muito com os filmes. “É interessante como o diretor apresenta algumas questões rígidas que envolviam as relações familiares e sexuais. Ver as pessoas se libertando num momento de repressão política nos leva a questionar o que impede de nos libertarmos também numa sociedade livre como a nossa.”


A apresentação do filme durou cerca de duas horas. Após a exibição houve um debate mediado pelo graduando em Comunicação Social, Gabriel Fortes, que está desenvolvendo seu trabalho de conclusão de curso sobre as obras de Almodóvar. Para o jornalista e idealizador da mostra, Deiverson Machado, o debate é imprescindível para estimular o senso crítico em relação ao que foi visto, além de promover a interação entre o público.
Na próxima quarta-feira, 01 de setembro, o cineclube Bordel sem Paredes apresenta o filme Labirinto de Paixões, às 19h no anfiteatro João Carriço – Funalfa. No mês de setembro o cineclube dará continuidade às exibições das obras de Pedro Almodóvar, mas, a partir de outubro, o público poderá escolher o cineasta homenageado através de votação no blog http://bordelsemparedes.blogspot.com


A equipe ainda não divulgou quem será o próximo cineasta a ganhar uma mostra no cineclube, mas já se adianta em informar que haverá a possibilidade do público decidir através de votação no blog Bordel sem Paredes (http://bordelsemparedes.blogspot.com/). Provavelmente irão entrar na disputa nomes conhecidos como Tim Burton, Martin Scorsese, David Lynch, Gus Van San e Woody Allen para disputarem a preferência do público. 
Os filmes vão ser exibidos no Anfiteatro da Funalfa, às 19h, às quarta-feiras entre os dias 18/08 e 15/09. A entrada é franca.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

O que eu fiz para merecer isto? por Vasco T. Menezes



O dia-a-dia de uma típica dona de casa madrilena. Viciada em anfetaminas (para conseguir ter energia para trabalhar também como mulher-a-dias), Gloria (Cármen Maura) vive num apartamento exíguo e sobrelotado com o marido, António (Angel De Andres-López), um taxista apaixonado pela cantora alemã de quem foi motorista, dois filhos que descobriram os benefícios monetários do tráfico de droga e da prostituição e a sogra avarenta que vende aos restantes membros da família madalenas e água com gás. Há ainda a vizinha prostituta (Verónica Forqué), um polícia impotente, dois escritores falhados e alcoólicos, uma criança com estranhos poderes mentais e um lagarto de estimação chamado “Dinheiro”…

“Que Fiz Eu para Merecer Isto?” (1984) é o quarto filme de Pedro Almodóvar, provavelmente o realizador espanhol mais internacionalmente aclamado desde Luis Buñuel. Por esta época, os Óscares e o reconhecimento de Hollywood ainda vinham longe e Almodóvar era “apeuma das figuras de proa da “Movida”, o movimento contracultural surgido em Madrid no final dos anos 70 como reacção ao final da ditadura franquista.

Nesses primeiros tempos a Espanha permissiva e democrática, o realizador fez um pouco de tudo, desde o teatro à BD, passando pela escrita e o cinema em Super-8 (ao mesmo tempo em que, durante o dia, trabalhava na Companhia Telefónica Nacional…), assumindo-se desde o início como um observador atento e mordaz da realidade espanhola, dos seus vícios e peculiaridades, num tom provocatório e ousado.

“Que Fiz Eu…” fica então como um dos melhores exemplos desse cinema neurótico e dinâmico, fazendo gala de uma sensibilidade marcadamente “camp” e “kitsch” (ainda hoje presente nos filmes mais recentes e “sérios” do cineasta) e pondo em cena uma galeria irresistível de personagens excêntricas.

Numa sucessão de “gags” tresloucados por onde passa um humor absurdo e negro, entre o grotesco e o escabroso, Almodóvar propõe uma visão satírica e subversiva das relações familiares e pessoais na sociedade moderna. É um objecto delicioso e inclassificável — da farsa ao drama, da comédia ao fantástico — que mistura, de forma improvável, Buñuel, De Palma, Wilder ou John Waters.

O que eu fiz para merecer isto? por Felipe Tolci



Ao assistir a uma obra do diretor Pedro Almodóvar, é preciso estar sempre preparado para a imprevisibilidade. Um filme neo-realista tragicômico, Que Fiz Eu Para Merecer Isto? - original de 1984 e relançado agora nos cinemas brasileiros - apresenta de maneira bem característica o estilo que o cineasta modelou ao decorrer da carreira.

Apesar de polêmico por chocar alguns amantes do cinema mais puritanos, é inegável o talento do diretor para agrupar diversos gêneros num só instante, criar situações arrebatadoras e dar vida aos seus personagens, por menor que seja sua participação na trama. Em Que Fiz Eu Para Merecer Isto?, Almodóvar não tem pudor e já abre a película com uma cena de sexo. Aos poucos, vai expelindo suas doses de sarcasmo, insanidade e bom humor.

A protagonista é Gloria, vivida dignamente por Carmem Maura, parceira de trabalho do cineasta, tendo protagonizado outros de seus filmes, como Matador (1986) e, o mais conhecido, Mulheres À Beira de Um Ataque de Nervos (1988). Insatisfeita com a vida que está levando, quase na miséria e em crise no casamento com o bruto taxista Antônio (Angel de Andres Lopez), a faxineira perde as estribeiras. A situação só piora quando é obrigada a passar por uma fase de abstinência sem poder comprar seu remédio para dormir. A escolha de Carmem foi fundamental, pois ela consegue transmitir perfeitamente a condição forte e impulsiva que sua personagem necessita.

No pequeno apartamento onde vive, Gloria divide a casa com seus dois filhos pré-adolescentes com tendências marginais e a sogra, avarenta e enxerida. Completa o núcleo da trama Cristal (Verônica Forqué), a vizinha que trabalha como prostituta e não deixa a protagonista em situações menos embaraçosas.

Almodóvar mostra já ter um bom domínio das câmeras neste filme, o segundo de sua carreira. Apesar do roteiro e a construção final imaturos, não faltam boas idéias e experimentações, as mesmas que o diretor aprendeu a lapidar com o tempo, fazendo com que o tornasse o principal representante do cinema espanhol.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

O que eu fiz para merecer isto?

O 4º filme da carreira de Almodóvar traz a tona uma família extremamente excêntrica de uma Espanha dos anos 80, onde uma diarista vive situações novas e ao mesmo tempo constrangedoras.

Uma comédia baseada na trágica cômica vida de uma mulher diarista. O que eu fiz para merecer isso? Filme
de Almodóvar filmado em 84, o quarto de sua carreira traz a tona temas polêmicos com uma pitada de sexo, reflexão da vida cotidiana e muito humor.

Glória uma diarista que habita em uma cadeia de prédios com inúmeras famílias, passa a se questionar sempre, sobre o porquê de todo aquele sofrimento diário e preocupação para com a família, sendo que todos são extremamente dispersos e apesar de habitarem o mesmo teto, cada um vive sua vida individualmente.
A família de Glória é composta por dois filhos, o mais velho é traficante, o mais novo é gay e mora com o dentista que é louco por meninos mais novos, o marido é um taxista mentiroso que fala alemão, a sogra uma velha viciada em água com gás e bolinho que mantêm guardados no armário dentro do quarto a chave e para finalizar, uma vizinha que ela tem como irmã chamada Cristal que é prostituta e sonha em ser atriz de Hollywood. Uma família completa pode dizer (risos), com todos os seus altos e baixos, porém a vida de Glória é realmente uma montanha russa cheia de surpresas, desde o momento em que ela se envolve com um policial impotente, até o ponto no qual ela vai trabalhar na casa de um casal de escritores fracassados cuja mulher é cleptomaníaco.

Se o filme for visto de um outro ângulo, podemos perceber até que ponto o ser humano pode-se dizer feliz com a vida e a com a família que leva, mesmo sofrendo e sempre reclamando dos fatores que impendem cada membro de ser feliz, a causa de inúmeros conflitos, principalmente na adolescência costuma ser jogado encima do núcleo familiar, culpando pai, mãe, filhos enfim, pessoas que dividem o mesmo teto. Atualmente para alguns a família serve como descarrego de todas as frustrações e descargas emocionais. Fatores familiares estão presentes no filme, assim como um não conflito de geração existente, e sim uma convivência em extrema harmonia e pacifismo que existe entre o filho mais velho de Glória com a sua avó paterna.

Glória vive surpresa durante todo o seu dia, além de ser viciada em remédios calmantes, sempre se vê em situações estranhas e algumas constrangedoras, como o assédio de uma policial impotente, até ter que ganhar uma grana extra junto com Cristal, para ver um cliente Vouyer se exibindo e tendo relação com a amiga.
Enfim, o filme é cheio de surpresa e traz temas reflexivos que podem ser usados e aplicados hoje, isso com muito humor característico de Almodóvar e não se preocupe se você se identificar com algum personagem ou lembrar de alguém quando ver o filme, essa é uma característica de Almodóvar.

Próxima Quarta - 15/09 - 19h na Videoteca João Carriço

O que eu fiz para merecer isto?

O próximo filme da mostra "A Essência de Almodóvar", " é o quarto longa-metragem do cineasta, Que Fiz Eu Para Merecer Isto? (1984), uma reunião dos personagens excêntricos que marcaram os primeiros filmes do diretor. Viciada em anfetaminas (para conseguir suportar o dia-a-dia do trabalho como dona de casa), a protagonista Gloria (Cármen Maura) reprime seus desejos em prol da atenção que dedica à família que, por sinal, é bem "esquisita". Seu marido, António (Angel De Andres-López), é um taxista apaixonado por uma cantora alemã. O filho mais velho é traficante de drogas, o caçula homossexual se prostitui e a sogra sovina traz para casa um lagarto de estimação chamado "Dinheiro". Para completar, há ainda a vizinha prostituta (Verónica Forqué), o policial impotente e a criança paranormal.

Com diálogos carregados de humor sarcástico, o roteiro - escrito por Almodóvar - coloca os personagens em constante confronto com as situações absurdas que encontram. O cineasta parece se divertir com as possibilidades cômicas de cada ação, provocando riso no espectador e facilitando a identificação do público com os protagonistas. Embora excêntricos, os personagens são demasiadamente humanos e acabam subvertendo os limiares éticos que definem o que é certo e o que é errado. Os acontecimentos estão para além do bem e do mal.

Quem é fã da cinematografia de Pedro Almodóvar certamente identificará, em Que Fiz Eu Para Merecer Isto?, algumas seqüências - como é o caso da cena do homem morto na cozinha - que foram retomadas em Volver, o último filme do cineasta espanhol. Entre o non sense e o corriqueiro, Que Fiz Eu para Merecer Isto? assume seu olhar mordaz e provocativo acerca dos vícios e das peculiaridades de qualquer família.


PRÓXIMA QUARTA - 15/09 - 19H NA VIDEOTECA JOÃO CARRIÇO 


quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Maus Hábitos por Alexx

Pedro Almodóvar é hoje considerado um dos melhores diretores a explorar na tela todo o lado feminino. Variando do sutil ao excêntrico, o cineasta consegue criar atmosferas únicas em seus filmes ao concentrar em suas lentes o belíssimo, complexo e singular universo feminino, e não me refiro aqui a apenas mulheres, mas qualquer pessoa que seja altamente envolvido por esse círculo, como maridos, filhos e até transexuais. Não foge ao olhar de Almodóvar nem mesmo uma das mais emblemáticas figuras do nosso mundo, as freiras. Essas mulheres, conhecidas principalmente por sua missão de renúncia a uma vida material enquanto abraça um matrimônio espiritual e tarefas humanitárias, sempre foram mitificadas pelas vidas que levam. Afinal, é no mínimo misteriosa a dedicação diária delas em ajudar o próximo abrindo mão de conquistas naturais ao ser humano, principalmente o amor idílico. Fora tudo isso, pouco percebemos que debaixo do véu tratam-se de mulheres comuns, seres humanos apenas, que embora levem uma vida de disciplina e renúncia, sentem os mesmos temores e passam pelos mesmos anseios. É assim que acompanhamos a vida das freiras do convento das "redentoras humilhadas", sem qualquer cliché, sem qualquer iconoclastia ou fundamentalismos.

Yolanda Bel, uma cantora de cabaré, vê sua vida de cabeça para baixo quando o namorado morre de overdose. Completamente desamparada, sem norte na vida, procura ajuda no convento das redentoras humilhadas após a visita da madre superiora no seu camarim. Admiradora fervorosa do trabalho marginal de Yolanda, a irmã passa a ajudar a cantora a encontrar sentido na sua vida dentro do convento, no dia a dia das freiras, na meditação, trabalho e dedicação espiritual. O convento já foi abrigo para muitas mulheres desamparadas, de vidas extremamente difíceis. Muitas foram as cafetinas, as drogadas, as prostitutas e até assassinas que lá se refugiaram para tentar encontrar um norte na vida. Agora, porém, o convento já não recebe tantas mulheres, já não se ouvem mais os cantos e as conversas daquelas que procuravam consolo. Os tempos mudaram, como atesta a amiga de uma das freiras, e a vida atrás das paredes do convento não permitiu a elas perceber que já não são mais o principal meio de ajuda para mulheres que se encontram em crise. Assim, quando Yolanda Bel procura ajuda à madre, esta última sente novamente esperança em ver o convento cheio de garotas e senhoras carentes de ajuda. Como as freiras acreditam na humilhação para edificação espiritual, elas se dão nomes bastante "impróprios", assim, passamos a acompanhar o dia a dia da irmã Esterco, irmã Perdida, irmã Víbora e irmã Rata de Esgoto.

O que é mais notável no longa é que as irmãs tinham raízes na vida libertina assim como as mulheres a quem ajudam, e como freiras, foram obrigadas a abdicar desse estilo de vida. No entanto, são muitos os "maus hábitos" que essas mulheres ainda mantém. É comum portanto encontrarmos uma irmã lendo contos eróticos, outra costurando roupas incomuns para as virgens, e até mesmo a madre superiora oferecendo cocaína à cantora refugiada em vez de livrá-la do vício. Desmascaradas aos olhos dos espectadores, as freiras e suas manias pouco comuns conduzem situações bastate divertidas, como a cena em que a irmã Esterco visita sua parente quando esta dá uma entrevista sobre sua carreira como escritora, ou quando as religiosas estão trabalhando numa feira de rua. São situações ligeiramente cômicas, de muita sutileza.

Ao longo da projeção percebemos o quanto o roteirista foi cauteloso em atribuir às freiras um intrincado jogo de idéias para que estas se auto-afirmassem como servas do senhor, mas com alguns deslizes permissíveis devido a suas naturezas humanas. Dessa forma, temos justificativas dígnas de um texto barroco, em que a lógica não se sobrepõe às palavras, como quando a madre superiora justifica porque ela continua a usar cocaína - "a cocaína é forte, assim como minha personalidade", ou como quando a mesma justifica porque ela é admiradora confessa de pessoas de vida tão leviana, de cantores de cabaré, dançarinas, atores e atrizes de segunda - "é no pecado dessas pessoas que Cristo morre e renasce a cada dia". Embora o diferencial do filme esteja no fato de se expor os maus hábitos do convento das redentoras humilhadas, jamais se faz qualquer julgamento das mesmas. Almodóvar prefere conferir uma imagem mais humana, do ponto de vista da imperfeição, a essas mulheres. Só assim podemos entender as dores de algumas delas, mesmo que sejam engraçadas algumas situações. Assim, o diretor jamais torna as personagens simples seres desprovidas de crises, nem as deixa se tornar caricaturas para o riso fácil. Antes, prefere conferir a cada uma das pessoas no convento uma altenticidade feminina, como de praxe em seus filmes. Depois do primeiro momento, em que olhamos para aquelas senhoras apenas como freiras, acompanhados do costumeiro espanto ao vê-las envolvidas em atividades tão pouco comuns, enxergamos em cada uma delas uma mulher de verdade, pessoas que não desvencilharam totalmente de seus vícios, mas que justificam os mesmos de alguma forma, ou se martirizam quando se trata de algo do qual não podem lidar. A figura mais forte do loga é com certeza a madre superiora. Com muita determinação, esta é capaz de usar quaisquer artifícios, mesmo os menos morais, para manter de portas abertas o convento que pode ser fechado pela ordem superior das irmãs. Ao mesmo tempo percebemos a dedicação desta para com Yolanda com um olhar não de amor solidário, mas de dedicação idílico-amorosa; como se Yolanda fosse sua janela para o mundo ao mesmo tempo que uma mulher atraente.

Volto a afirmar que o filme jamais trata as freiras de forma jocosa ou ironizadora. O objetivo de Almodóvar não era criar situações que coubessem julgamentos. Portanto o espectador deve se despir de qualquer preconceito ou opinião formada sobre a vida dessas mulheres. Não é um filme que faz qualquer crítica sobre a igreja, sobre a vida nos conventos, ou sobre os próprios vícios das irmãs. O que temos no longa é na verdade um tratamento mais feminino sobre as freiras, despido de qualquer exaltação religiosa. O importante não é julgar, mas entender e divertir-se com aquilo que imaginamos ser incomum.

Verdade seja dita: não espere risos fáceis em Maus Hábitos. O filme não é uma comédia excêntrica como os adolescentes acostumaram a ver nos anos 2000 com filmes de situações forçadas e personagens pouco convincentes. Estamos falando de Pedro Almodóvar, um brilhante diretor do cinema contemporâneo, portanto a obra conquista mais sorrisos que risos. Temos ao longo da projeção situações hilárias, mas tudo no seu devido comedimento. Fica ao final um gosto indefinível, de uma comédia meio triste, mas a sensação de um ótimo filme, conduzido com maestria sobre um tema bastante delicado. Não, não se trata da religiosidade, mas de outro tema ainda tão complexo quanto, embora também bonito e indecifrável, o universo feminino.

PRÓXIMA QUARTA - 08/09 - 19 HORAS NA VIDEOTECA JOÃO CARRIÇO 

Maus Hábitos


















O filme de semana que vem é Maus Hábitos, um dos filmes mais hilários do diretor Pedro Almodóvar. Maus Hábitos escracha a pureza e a dedicação das freiras de um conventos.
Yolanda Bell, uma jovem cantora de bolero leva uma vida cheia de drogas, exageros e ambiguidades, até que assiste seu namorado morrer de overdose de heroína misturada com estricnina.

Apavorada, ela decide desaparecer. Busca refúgio no convento das "redentoras humilhadas", cuja Madre Superiora manifesta sua admiração por Yolanda numa noite em que vai assistir ao seu show no "Molino Rojo". Por muitos anos as "redentoras humilhadas" têm tentado salvar jovens moças que levam vida de perdição. Ultimamente, porém, a comunidade atravessa uma crise: poucas garotas desejam ser salvas.

















"Redentoras Humilhadas" é um retiro espiritual para freiras que já foram prostitutas, assassinas, cafetinas, entre outras profissões nada nobres. Para compensar os pecados elas se chamam de "Irmã Esterco", "Irmã Rata de Porão", entre outros codinomes meigos. E, como ninguém é de ferro, as freiras não abandonaram a cocaína, os bordéis e outros hábitos.


Desta maneira Yolanda é muito bem recebida, especialmente pela Madre Superiora, um cruzamento entre São João Bosco e Jean Genet, cuja fascinação pelo mal a torna uma cúmplice de todas as garotas que passam pelo convento.

Próxima Quarta-feira - 19h na Videoteca João Carriço.